A nova face da dopamina: sinais precisos na complexidade cerebral
Um estudo inovador revela que a dopamina no cérebro comunica de forma mais sofisticada do que se pensava, emitindo sinais agudos direcionados a células vizinhas.

A dopamina, um dos neurotransmissores mais investigados no cérebro humano, continua a surpreender os cientistas com as suas funções. Durante muito tempo, acreditou-se que, ao ser libertada, a dopamina se difundia lentamente, como um megafone químico, enviando informações a várias células-alvo. Novas investigações, no entanto, estão a mudar essa concepção clássica.
Um estudo recente, publicado na revista Science, indica que a dopamina pode também emitir sinais curtos e agudos, que são enviados com precisão para células vizinhas em milissegundos. Se os investigadores estiverem corretos, essa capacidade de sinalização localizada pode ser um “bloco de construção fundamental” que tem sido ignorado nos modelos do sistema de dopamina cerebral.
A dopamina exerce funções distintas no cérebro comparativamente ao que faz no restante do corpo. Enquanto no sangue modula a atividade de diversos órgãos e as respostas imunitárias, no cérebro atua como um mensageiro químico essencial para uma grande variedade de comportamentos, incluindo movimento, humor, sono, memória, recompensa e motivação.
Estudos demonstraram que os neurónios que libertam dopamina possuem padrões variados de disparo, mas ainda não se compreende totalmente que informações estão codificadas nesses sinais, nem quais são as suas funções específicas.
A capacidade de transmitir sinais rápidos e lentos poderá ser a chave para a versatilidade e especificidade do sistema dopaminérgico. Utilizando uma técnica avançada de imagem, cientistas da Universidade do Colorado e da Universidade Augusta, nos EUA, induziram a libertação local de dopamina em cérebros de camundongos. Com auxílio de coloração fluorescente, observaram que os recetores eram ativados em áreas muito pequenas de neurónios adjacentes, resultando numa resposta neural rápida. Em contrapartida, a libertação de dopamina mais ampla provocou uma resposta mais lenta.
Christopher Ford, farmacologista da Universidade do Colorado, destaca: “A nossa investigação atual revelou que a sinalização e a transmissão da dopamina no cérebro são muito mais complexas do que imaginávamos. Sabíamos que a dopamina era crucial para muitos comportamentos diferentes, e o nosso trabalho oferece um ponto de partida para compreender como estes comportamentos podem ser regulamentados pela dopamina.”
Os neurónios analisados por Ford e a sua equipa provêm do estriado, uma região dos gânglios da base que desempenha um papel nos sistemas motores e de recompensa, rica em neurónios que liberam dopamina. Este espaço cerebral recebe estímulos dopaminérgicos de várias áreas e está associado a distúrbios neurodegenerativos como a esquizofrenia, dependência e Transtorno do déficit de atenção e hiperatividade.
A Doença de Parkinson, por exemplo, é caracterizada pela degeneração dos neurónios dopaminérgicos que se ligam ao estriado. Compreender melhor como a dopamina transmite sinais nesta região cerebral é crucial para o desenvolvimento de novos tratamentos para diversas condições.
“Estamos apenas a arranhar a superfície na tentativa de decifrar como as disfunções dopaminérgicas contribuem para doenças como Parkinson, esquizofrenia ou dependência,” afirma Ford. “É necessário um trabalho mais aprofundado para desvendar como essas alterações na sinalização da dopamina se manifestam em diferentes patologias neurológicas e psiquiátricas.”