Cultura

Cinema moçambicano como ferramenta de luta e identidade

Cineastas de Moçambique ressaltam na Lusa a importância do cinema na educação e na mobilização cultural durante as lutas de libertação africanas, enfatizando a necessidade de preservação do património audiovisual.

Os cineastas moçambicanos João Ribeiro e Sol de Carvalho, em entrevista à Lusa, sublinharam o papel vital do cinema como "ferramenta de sensibilização e educação", além de mobilizar apoio para as lutas de libertação nos países africanos.

João Ribeiro, presente na terceira edição dos Encontros do Património Audiovisual, que decorrem esta semana em Maputo, destacou que "o cinema sempre foi usado como uma forma de educação e sensibilização". Ele observa que, nos anos 60, a comunicação em Moçambique era, em grande parte, mediada pelo cinema, uma vez que a rádio era a única alternativa disponível.

O cineasta de 62 anos afirmou que o cinema foi um "instrumento de educação" tanto durante a luta as lutas de libertação quanto nos primeiros anos após a independência, quando havia necessidade de educar o povo sobre novas formas de viver.

Sol de Carvalho, de 72 anos, recordou que os filmes dessa época desempenharam um papel crucial na diplomacia africana. "Era essencial estabelecer relações com países ocidentais", explicou, revelando que muitos dos filmes foram produzidos em inglês ou francês antes mesmo de serem feitos em português, para chegar até organizações e governos estrangeiros.

Ele ressaltou que "a Jugoslávia foi responsável pela maior parte dos filmes moçambicanos da luta armada", evidenciando a colaboração internacional na realização de obras que visavam mostrar ao mundo a luta organizada contra a opressão colonial.

Durante os Encontros do Património Audiovisual, evento promovido pela Associação dos Amigos do Museu do Cinema em Moçambique e financiado pela Fundação Calouste Gulbenkian, João Ribeiro e Sol de Carvalho partilharam a urgência de revisitar a história do cinema como um meio de construir identidades africanas e entender o papel da cultura nas independências.

João Ribeiro, conhecido por suas produções premiadas como "Avó Dezanove e o segredo do soviético", vê a reflexão sobre o cinema durante o período das independências como uma forma de conectar o passado com o presente e compreender a identidade nacional. "A independência abrange não apenas a dimensão política, mas também as esferas social e cultural", afirmou.

Sol de Carvalho, um dos cineastas mais respeitados de Moçambique, enfatizou a importância de estudar a história das independências, afirmando que "a história é dinâmica" e que é fundamental entender os eventos que moldaram o presente.

A meio século das independências, o cineasta expressou preocupação com a falta de políticas públicas para a preservação audiovisual no país. "Estamos a debater a história das imagens do nosso país, e onde está o Governo?", questionou, defendendo que o trabalho de preservação do legado audiovisual deve ser valorizado e apoiado.

Sol de Carvalho, por sua vez, alertou para a ausência de políticas de digitalização e conservação do acervo cinematográfico nacional, criticando que a falta de apoio torna a recuperação de técnicas e equipamentos antigos "quase impossível".

#CinemaAfricano #CulturaMoçambicana #LutasDeLibertação