"Burn burn burn": Uma Denúncia Através da Arte na Culturgest
A peça "Burn burn burn", dos Os Possessos, aborda como os extremismos alimentam a divisão social. A estreia acontece na Culturgest, em Lisboa, na quinta-feira.
 
          
          
        Na próxima quinta-feira, a Culturgest, em Lisboa, será palco da estreia da peça "Burn burn burn", uma produção do grupo Os Possessos. A obra, concebida por Isabel Costa e Catarina Rolo Salgueiro, é uma reflexão provocadora sobre as “manobras de distração dos extremismos” que visam aumentar a brutalidade e a divisão na sociedade, conforme explicaram as criadoras à Lusa.
Inspiradas no notório romance Fahrenheit 451 de Ray Bradbury, as coautoras exploraram a visceral “inflamação e o fogo” que permeiam as relações sociais, seja no seio da família ou entre amigos. Catarina, que também assina a encenação, sugeriu inicialmente a leitura conjunta da obra, que se tornou o ponto de partida para a construção da peça.
Mais do que uma simples adaptação da narrativa distópica de 1953, o intuito primordial foi debater os argumentos que justificam a queima de livros numa sociedade carente de pensamento crítico. "Burn burn burn" desenrola-se na década de 2020, numa biblioteca pública, onde se debatem temas que, apesar de escritos há mais de sete décadas, revelam uma surpreendente proximidade com a atualidade.
Dentro deste cenário, um clube de leitura reúne pessoas de perspetivas diversas. À medida que analisam os conteúdos da obra de Bradbury, embora o título nunca seja mencionado, os discussantes mostram como a literatura pode provocar divisões. “As opiniões acabam por ser extremadas, quase como se fossem leis, o que gera conflito e dificuldades de comunicação”, destacou Isabel Costa.
A escalada desta incapacidade de diálogo leva os membros do clube a se transformarem em personagens emblemáticas do livro, como Guy Montag e Clarisse McClellan. Além disso, um estúdio de gravação na biblioteca permite a inserção de dois personagens que comentam a ação, ligando eventos históricos, como a queima de livros em Alexandria, a questões atuais.
Com um cenário recheado de estantes com livros, mesas e uma área de descanso, a biblioteca da peça também acaba por ser consumida pelas chamas. Apesar do título de caráter irónico, Isabel acredita que o espetáculo é “esperançoso”, refletindo a necessidade de um debate aberto sobre a sociedade contemporânea.
Com um final subjacente de “redenção” e uma mensagem de que a literatura deve ser elogiada, as autoras pretendem iluminar o espírito crítico, essencial para sustentar a democracia. “Se não mudarmos a nossa forma de agir, a democracia estará em risco”, concluiu.
A peça terá apresentações na quinta e sexta-feira, às 21:00, e no sábado, às 19:00, no auditório Emílio Rui Vilar da Culturgest. A sessão de sexta será legendada em inglês, enquanto a de sábado contará com audiodescrição e interpretação em Língua Gestual Portuguesa. No dia 3 de novembro, haverá uma performance especial para escolas.
O elenco é composto pelas autoras, juntamente com Beatriz Brás, João Pedro Mamede, João Pedro Vaz, Leonardo Garibaldi, Leonor Buescu e Tomás Alves. Os aspetos técnicos são assegurados por Anna Leppänen na assistência de encenação, Joana Subtil em cenografia, Nádia Henriques em figurinos, Manuel Abrantes na luz e Miguel Nicolau no desenho sonoro e composição musical. A produção é uma colaboração entre Os Possessos e a Culturgest, em parceria com o Teatro-Cine Torres Vedras.