Médicos Sem Fronteiras critica distribuição de alimentos em Gaza: "Ataques deliberados"
Médicos Sem Fronteiras exige o fim da Fundação Humanitária de Gaza, acusando-a de ser palco de atentados contra palestinianos em situações de fome.

A organização Médicos Sem Fronteiras (MSF) anunciou hoje a sua demanda pelo encerramento dos pontos de distribuição de alimentos dirigidos pela Fundação Humanitária de Gaza (FHG), que é supervisionada por Israel e Estados Unidos. A MSF classifica esses locais como cenários de "assassinatos orquestrados" direcionados a palestinianos em situação de vulnerabilidade.
A acusação baseia-se numa análise de dados médicos e testemunhos recolhidos em duas clínicas geridas pela MSF em Gaza, onde foram atendidas centenas de vítimas nas semanas recentes.
Segundo a MSF, os pontos de distribuição da FHG foram alvo de "violência direcionada e indiscriminada" perpetrada pelas forças israelitas e fornecedores privados norte-americanos, resultando em tragédias para os palestinianos que ali buscavam alimento.
A MSF apela ao "desmantelamento imediato da FHG" e à reinstauração do apoio humanitário sob coordenação da ONU, solicitando também que os governos, com destaque para os Estados Unidos, interrompam qualquer apoio financeiro ou político a esta fundação.
Num relatório divulgado hoje, a organização de ajuda médica partilha relatos alarmantes sobre os "horrores testemunhados" nas suas clínicas, que acolheram um grande número de vítimas após incidentes em áreas controladas pela FHG. Durante o período de 7 de junho a 24 de julho, a MSF foi a única entidade autorizada a fornecer ajuda humanitária em Gaza, acolhendo 1.380 vítimas, incluindo 28 mortos, nas clínicas Al-Mawasi e Al-Attar.
As equipas de médicos trataram "71 crianças com ferimentos de bala", sendo 25 delas menores de 15 anos. Por falta de alternativas para procurar alimento, as famílias enviavam os seus adolescentes para essas zonas perigosas, dado que muitas vezes eram os únicos capazes de realizar essa jornada arriscada.
Entre as vítimas tratadas encontrava-se um jovem de 12 anos alvejado e cinco raparigas, uma das quais apenas com 8 anos, também ferida a tiro.
A diretora-geral da MSF, Raquel Ayora, revela que "as crianças foram atingidas no peito enquanto tentavam recolher comida", relatando ainda que "multidões inteiras foram alvo de disparos em locais de distribuição".
Ayora afirmou: "Em quase 54 anos de operação da MSF, raramente presenciamos tal nível de violência sistemática contra civis desarmados. Isto tem de acabar." O relatório também menciona que, entre 27 de julho e 2 de agosto, 186 pessoas feridas, incluindo dois mortos, foram atendidas nas clínicas da MSF, evidenciando uma crescente crise humanitária.
A análise das feridas revela que 11% dos ferimentos foram na cabeça e no pescoço, o que, segundo a MSF, aponta para um fogo intencional, ao invés de tiros acidentais.
A atual guerra entre Israel e o Hamas, iniciada em 7 de outubro de 2023, resultou em mais de 61 mil mortos palestinianos e em um bloqueio severo a Gaza, que dificultou a entrada de bens essenciais.
A situação humanitária deteriorou-se rapidamente com a suspensão dos pontos de acesso para ajuda, levando MSF a descrever a resposta israelita como uma tentativa de militarizar a distribuição humanitária na região, sob o controlo da FHG.
Conforme a MSF, os pontos de distribuição não representam uma solução viável, mas sim um "esquema mortífero" que institucionaliza a política de fome promovida pelas autoridades israelitas em Gaza.